segunda-feira, 18 de abril de 2011

Classificação dos institutos jurídicos e concursos públicos


Caro colega concurseiro,

Este artigo abordará uma questão espinhosa para quem se prepara para concursos públicos: a classificação dos institutos jurídicos.

Consoante ensina Maurício Godinho Delgado,

“classificação é o procedimento de investigação e análise científicas pelo qual se agrupam seres, coisas ou fenômenos, segundo um elemento relevante de comparação entre eles. A Ciência do Direito apropria-se do procedimento classificatório para construir tipologias concernentes a figuras e institutos jurídicos.[1]

Depois de efetuada a devida classificação, é possível determinar a natureza jurídica do instituto, assim considerado o posicionamento deste no conjunto de figuras próximas. Desse modo, definir a natureza jurídica de determinado instituto equivale, grosso modo, a classificá-lo por aproximação a outra figura jurídica.

Exemplo: qual é a natureza jurídica dos adicionais?  Como os adicionais são pagos ao empregado, devemos pensar em como são classificados os pagamentos feitos, pelo que temos a classificação dos pagamentos em “salário” e “indenização”. Deste ponto em diante, a tarefa é verificar destas classificações é mais adequada àquele instituto jurídico para o qual queremos determinar a natureza. No caso, para a doutrina e jurisprudência amplamente majoritárias a natureza jurídica dos adicionais é salarial.

Mencionei no início deste artigo que a questão é espinhosa porque normalmente a classificação é obra da doutrina, pelo que cada doutrinador adota a sua...  Logo, o candidato se vê em verdadeiras encruzilhadas no momento de sua preparação, pois a banca pode escolher qualquer destas classificações em uma eventual questão de concurso.

Não há muito remédio para este mal. Particularmente sempre achei estas questões absolutamente despropositadas, e no meu tempo de concurseiro certamente este tipo de conhecimento não fazia parte dos meus planos de estudo seletivo. Sempre assumi o risco. Às vezes perdia, normalmente não.

Ocorre que alguns concursos, como, por exemplo, aqueles voltados para os cargos administrativos dos TRTs (Analista e Técnico), praticamente não dão margem ao estudo seletivo, pois o índice de acerto dos aprovados é muito alto, dado o exíguo número de cargos vagos. Se este é o seu caso, faz-se necessário correr atrás das classificações.

Aí vem a pergunta seguinte: qual é o doutrinador mais indicado, professor?  Depende. De uma forma geral eu sempre recomendo o Godinho Delgado, por ser a grande referência em Direito do Trabalho atualmente, inclusive para a grande maioria das bancas examinadoras.  Entretanto, nem sempre é o suficiente. Vejamos uma questão recente, do concurso do TRT da 14ª Região:

(Técnico – TRT da 14ª Região – FCC – 2011)
46. Classifica-se o contrato de trabalho em comum e especial quanto
(A) à qualidade do trabalho.
(B) à forma de celebração.
(C) ao consentimento.
(D) à duração.
(E) à regulamentação.

Se você estudou pelo livro do Godinho, não saberia a resposta, ou ao menos não teria a abordagem direta desta questão. Ao contrário, quem estudou pelo Curso de Direito do Trabalho da Profª. Alice Monteiro de Barros não teve problemas. Veja só:

Há uma variedade de critérios de classificação do contrato de trabalho. Eles se classificam, quanto à forma de celebração, em escritos ou verbais; quanto à regulamentação, em comuns e especiais; quanto ao local de prestação de serviços, no estabelecimento do empregador, externamente e no domicílio do empregado; quanto à qualidade do trabalho, em manual, técnico e intelectual; quanto aos sujeitos, em contrato individual e contrato de equipe; quanto ao modo de remuneração, por unidade de tempo, por unidade de obra ou misto; quanto à duração, o contrato poderá ser determinado ou indeterminado. (...) Quanto ao fim ou quanto à índole da atividade em doméstico, rural, urbano, marítimo, industrial e comercial.[2]” (grifos no original)

Sugiro que você estude esta lição da Profª. Alice, pois a FCC costuma repetir questões, especialmente as deste tipo. Quanto às demais classificações relevantes ao estudo do Direito do Trabalho, me comprometo com você a inserir, no meu livro (está quase pronto, só mais um pouquinho de paciência), um grande quadro sinóptico, com todas elas!

Abraço e bons estudos!

Ricardo Resende


[1] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 9. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 868.
[2] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. – 6. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 237.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Doméstico: requisitos específicos para caracterização (2ª parte)

Caro colega concurseiro,

A título de conclusão do assunto iniciado no artigo anterior, qual seja, a caracterização da relação de emprego doméstico, resta-nos a análise do requisito continuidade.

Com efeito, o art. 1º da Lei nº 5.859/1972 dispõe que:

Art. 1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta lei.

Se para a caracterização da relação de emprego genérica exige-se a não eventualidade (art. 3º da CLT), para o vínculo de emprego doméstico faz-se necessário que a prestação de serviços tenha natureza de continuidade.

Embora alguns autores defendam que as expressões são sinônimas, não é esta a interpretação dada pela jurisprudência majoritária, a qual deve ser sempre seguida pelo candidato atento.

A não eventualidade se contrapõe, por óbvio, à eventualidade. E o que não é eventual não necessariamente será contínuo. Alguns autores se limitam a caracterizar a não eventualidade sempre que o serviço em questão seja necessário ao normal desenvolvimento da atividade do empregador. Não me parece, entretanto, que a definição resolva o problema em todos os casos. Imagine-se, por exemplo, o trabalho dos chapas, os quais são considerados eventuais, porque não se fixam ao tomador dos serviços, porque oferecem seus serviços indistintamente àquele que primeiro os solicitar. Neste caso, embora a atividade (movimentação de mercadorias) seja necessária ao desenvolvimento da atividade da transportadora, este trabalhador não será empregado, posto que ausente o requisito não eventualidade.

A melhor definição que eu já vi a respeito da não eventualidade é aquela dada em aula pelo Prof. Otávio Calvet: exerce atividade não eventual aquele trabalhador que presta serviços de forma repetida ao tomador, com previsão de repetição futura, em atividade permanente na empresa (ainda que seja atividade-meio), e fixado juridicamente ao tomador dos serviços. A fixação jurídica decorre da própria intenção do obreiro de estabelecer um liame jurídico mais forte com o tomador dos serviços, um compromisso, ao contrário do que ocorre com o chapa, que vende sua força de trabalho a cada dia, não importando para quem.

A fim de ilustrar a afirmação de que nem sempre o que é não eventual será contínuo, imagine-se a figura clássica do garçom de uma pizzaria, que trabalha apenas às sextas-feiras à noite. O trabalho não é, evidentemente, contínuo. Entretanto, é não eventual, senão vejamos: a) é repetido, ou seja, toda sexta-feira o garçom está lá, naquele mesmo local; b) é repetível futuramente, isto é, em princípio aquela atividade se repetirá nos próximos finais de semana; c) a atividade é permanente na empresa (sem nenhuma dúvida o é); d) o trabalhador se fixa juridicamente ao tomador dos serviços, pois há um compromisso com aquele determinado tomador, para o qual será reservado o horário das sextas-feiras à noite, em troca da contraprestação pactuada (salário).

No caso do doméstico, o legislador se referiu à continuidade. Em consonância com tal entendimento, Alice Monteiro de Barros ensina que

“Não nos parece esteja incluída no art. 1º da Lei n. 5.859 a trabalhadora chamada, impropriamente, de ‘diarista’ (faxineira, lavadeira, passadeira, etc.), que trabalha nas residências, em dias quaisquer, para diversas famílias. É que a Lei n. 5.859, de 1972, considera doméstico ‘quem presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas...’ (art. 1º).

De acordo com o Novo Dicionário Aurélio, o vocábulo ‘contínuo’ significa ‘em que não há interrupção, seguido, sucessivo’.

É necessário, portanto, que o trabalho executado seja seguido, não sofra interrupção. Portanto, um dos pressupostos do conceito de empregado doméstico é a continuidade, inconfundível com a não eventualidade exigida como elemento da relação jurídica advinda do contrato de emprego firmado entre empregado e empregador, regido pela CLT. Ora, a continuidade pressupõe a ausência de interrupção, enquanto a não eventualidade diz respeito ao serviço que se vincula aos fins normais da atividade da empresa.[1]

Daí surge a figura conhecida da diarista, que tanta confusão gera especialmente na cabeça do leigo. A jurisprudência tende a acolher a distinção, razão pela qual este é o entendimento que recomento para concursos públicos, notadamente para provas objetivas.

Neste sentido, os seguintes julgados do TST:

RECURSO DE REVISTA. DIARISTA DOMÉSTICA. LABOR ATÉ DOIS DIAS DA SEMANA. RELAÇÃO DE EMPREGO. INEXISTÊNCIA. Empregado doméstico é a pessoa física que presta, com pessoalidade, onerosidade e subordinadamente, serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, em função do âmbito residencial destas. Incontroversos os demais elementos fático-jurídicos, porém comprovando-se o labor por somente dois dias na semana, configura-se o caráter descontínuo da prestação de trabalho, fora do pressuposto específico da Lei n. 5859/72. Recurso de revista não conhecido. (Processo: RR - 10600-44.2006.5.01.0058 Data de Julgamento: 06/10/2010, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/10/2010.)

TRABALHO PRESTADO NO ÂMBITO DOMÉSTICO. DIARISTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TRÊS VEZES NA SEMANA. AUSÊNCIA DE VÍNCULO DE EMPREGO.

A diarista, que presta serviços em dias alternados em casa de família, não tem vínculo empregatício como doméstica, em face do não preenchimento dos requisitos necessários à caracterização da relação de emprego. Recurso de revista conhecido e desprovido. (Processo: RR - 58100-60.2005.5.01.0020 Data de Julgamento: 04/08/2010, Relator Juiz Convocado: Roberto Pessoa, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 10/09/2010.)

Esclareça-se, entretanto, a título de curiosidade, que não existe um número cabalístico de vezes em que a diarista pode trabalhar na residência para que não reste configurado o vínculo de emprego. Desse modo, não passa de mito o que ouvimos e lemos por aí, no sentido de que “até duas vezes por semana”, ou “até três vezes por semana”, é diarista, mais que isto, empregado. O que existe é a diferença (no entendimento majoritário) entre continuidade e não eventualidade, conforme mencionado até aqui. A decisão dependerá da análise das provas, do caso concreto e da orientação do Juiz.

Alguns Juízes, por exemplo, alinhando-se à tese de que as duas expressões (não eventualidade e continuidade) seriam sinônimas, buscam na fixação jurídica a caracterização da relação de emprego, de forma que a obreira que trabalha duas vezes por semana na residência, mas sempre nos mesmos dias, durante anos (o que indica um compromisso duradouro, não eventual), seria empregada, e não diarista.

Cuidado!  Este entendimento (últimos dois parágrafos) não é acolhido pelo TST, pelo que também não deve ser levado em conta por você, concurseiro vencedor, salvo apenas como contraponto, em uma eventual resposta a questão discursiva. Se você tiver alguma dúvida acerca disso, basta fazer uma rápida pesquisa no site do TST, em "notícias", procurando por “diarista”.

Abraço e bons estudos!

Ricardo Resende




[1] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. – 6. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 347/348.

domingo, 10 de abril de 2011

Doméstico: requisitos específicos para caracterização (1ª parte)


Caro colega concurseiro,

No tocante ao estudo da relação de emprego, uma das questões mais exploradas em concursos públicos é a caracterização da relação de emprego doméstico. Com efeito, o vínculo de emprego do doméstico é peculiar, nos termos do art. 1º da Lei nº 5.859/1972:

Art. 1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta lei.

Portanto, o doméstico é aquele empregado qualificado pelos requisitos específicos, quais sejam:

a) continuidade da prestação dos serviços;

b) finalidade não lucrativa dos serviços prestados à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.

Como empregado que é, o vínculo do doméstico depende dos requisitos gerais caracterizadores da relação de emprego, que são a pessoalidade, a onerosidade e a subordinação. O requisito da não eventualidade, extraído do disposto no art. 3º da CLT, é substituído, no caso do doméstico, pela continuidade. Tratarei deste requisito no próximo artigo, para fins didáticos, ou seja, para não desviar o foco daquilo que realmente pretendo abordar neste artigo.

Vejamos então a questão da finalidade não lucrativa dos serviços.

Em primeiro lugar, há que se tomar especial cuidado para não confundir finalidade não lucrativa dos serviços e ausência de onerosidade. Os serviços domésticos não têm finalidade lucrativa para o empregador, e não para o empregado doméstico, cujos serviços prestados visam à contraprestação, consubstanciada na remuneração. Do contrário, não teríamos o preenchimento do requisito onerosidade e, consequentemente, ausente estaria o liame empregatício.  

Desse modo, ao mencionar que o empregado doméstico é aquele que presta serviços de finalidade não lucrativa, quis o legislador dizer que a atividade do empregador doméstico não pode envolver qualquer tipo de lucro. Em esclarecedora lição, diz-se que a relação de emprego doméstico deve se limitar ao uso/consumo dos serviços, jamais podendo produzir valor de troca.

Imaginemos um exemplo: um caseiro de sítio de veraneio trabalha tomando conta da casa e arredores, bem como realizando tarefas de manutenção em geral. Neste caso, será doméstico.  Em outra hipótese, em que este caseiro, além de tomar conta da casa e realizar a manutenção das instalações, cultiva hortaliças e cria animais destinados à venda, não há se falar em vínculo doméstico, eis que presente a atividade lucrativa. Da mesma forma, se um profissional liberal, um advogado, por exemplo, tem seu local de trabalho anexo à sua residência, e um empregado se encarrega da limpeza dos dois ambientes (a casa e o escritório), este não poderá ser considerado doméstico, dada a finalidade lucrativa da atividade profissional ali desenvolvida.

Intrinsecamente ligada a tal requisito está a circunstância de o empregado doméstico prestar serviços à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.

A principal decorrência desta parte do dispositivo (art. 1º da Lei nº 5.859/1972) é a impossibilidade de prestação de trabalho doméstico a pessoa jurídica. Com efeito, somente pessoa física pode ser empregadora doméstica. Por este motivo não são aceitáveis os famosos “diaristas” que prestam serviços a empresas, de forma que a faxineira que trabalha para empresa uma vez por semana é empregada em geral, e não doméstica/diarista[1].

Também a questão do âmbito residencial deve ser interpretada de forma sistemática, e não literal. Na lição de Maurício Godinho Delgado, “o que se considera essencial é que o espaço de trabalho se refira ao interesse pessoal ou familiar, apresentando-se aos sujeitos da relação de emprego em função da dinâmica estritamente pessoal ou familiar do empregador[2]” (grifos no original).

Finalmente, embora a lei se refira à prestação de serviços à pessoa ou família, a doutrina e a jurisprudência amplamente majoritárias admitem a contratação de doméstico por um determinado grupo unitário de pessoas físicas, cujo exemplo clássico é o da república de estudantes, desde que a energia de trabalho seja meramente consumida pelo grupo, sem qualquer finalidade lucrativa.

A título de exemplo, a FCC cobrou recentemente esta noção, na prova do TRT da 14ª Região, realizada em abril/2011. Vejamos a questão:  

(AJAJ – TRT da 14ª Região – FCC – 2011)
Karina e Mariana residem no pensionato de Ester, local em que dormem e realizam as suas refeições, já que Gabriela, proprietária do pensionato, contratou Abigail para exercer as funções de cozinheira. Jaqueline reside em uma república estudantil que possui como funcionária Helena, responsável pela limpeza da república, além de cozinhar para os estudantes moradores. Abigail e Helena estão grávidas. Neste caso,
(A) nenhuma das empregadas são domésticas, mas ambas terão direito a estabilidade provisória decorrente da gestação.
(B) ambas são empregadas domésticas e terão direito a estabilidade provisória decorrente da gestação.
(C) somente Helena é empregada doméstica, mas ambas terão direito a estabilidade provisória decorrente da gestação.
(D) somente Abigail é empregada doméstica, mas ambas terão direito a estabilidade provisória decorrente da gestação.
(E) ambas são empregadas domésticas, mas não terão direito a estabilidade provisória decorrente da gestação.

Abigail, que trabalha no pensionato de Gabriela, não é doméstica, tendo em vista a finalidade lucrativa da atividade desenvolvida pela empregadora.

Helena, por sua vez, é doméstica, pois trabalha em uma república de estudantes, em atividades de mero consumo por parte dos tomadores de serviço (limpeza do local e preparo das refeições para os estudantes moradores da república).

A resposta é letra “C”, pois tanto as empregadas em geral quanto as domésticas têm direito à garantia de emprego decorrente de gestação, respectivamente por força do art. 10, II, “b”, do ADCT da CRFB/88, e do art. 4º-A da Lei nº 5.859/1972.

Nas minhas aulas sempre mencionei este exemplo clássico da república de estudantes e do pensionato. Caso ainda reste alguma dúvida acerca do entendimento aqui defendido, mencionem-se, a título de exemplo, as seguintes fontes:

“A lei refere-se à pessoa ou família. Contudo, evidentemente que certo grupo unitário de pessoas físicas, atuando estritamente em função de interesses individuais de consumo pessoal, pode também tomar trabalho doméstico, nos moldes da Lei n. 5.859/72. É o que se passa, por exemplo, com uma informal república estudantil e sua faxineira/cozinheira (caso que não se confunde, por óbvio, com o pensionato, em que alguém explora a oferta ao mercado de serviços de moradia e alimentação).[3]” (grifos no original)

“O serviço doméstico pode ser prestado a pessoa que reside só, a família ou até mesmo a pessoas que se reúnem para viver comunitariamente, como em uma república de estudantes, por exemplo, onde não se explora qualquer atividade lucrativa.[4]

“O trabalho prestado para um grupo de pessoas que se reúne de forma espontânea e coabitam no mesmo local, cujo serviço se destina ao consumo pessoal de cada membro do grupo, sem natureza lucrativa, pode tomar a forma de relação doméstica, desde que caracterizados os requisitos contidos na Lei nº 5.859/72. Tal situação pode ocorrer na informal república estudantil, com uma faxineira ou cozinheira contratada para trabalhar para o grupo.[5]

No próximo artigo tratarei do primeiro requisito para caracterização da relação de emprego doméstico (continuidade), donde emerge a figura do diarista.

Abraços e bons estudos!

Ricardo Resende
ricardoresendeprof@gmail.com


[1] A questão da diarista será tratada no próximo artigo, neste mesmo blog.
[2] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 9. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 362.
[3] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. – 9. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 361.
[4] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. – 6. ed. – São Paulo : LTr, 2010, p. 345.
[5] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. – 4. ed. – Niterói : Impetus, 2010, p. 351.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Estudo da Lei 8.036/1990 para concursos

Caro colega concurseiro,

Provavelmente em virtude da melhor preparação dos candidatos, da maior oferta de material de estudo de qualidade, bem como do esgotamento de certos modelos de questões até então tradicionais, as bancas examinadoras têm apelado para novos enfoques, cobrando do candidato assuntos até então pouco explorados e, muitas vezes, de pouquíssima relevância prática.

Exemplo disso é a forma como as bancas examinadoras em geral, e a FCC em especial, têm cobrado o assunto FGTS. Com efeito, embora alguns aspectos do Fundo de Garantia sejam extremamente importantes no cotidiano trabalhista, as questões de concurso sobre o tema têm se limitado à parte “picuinha” da Lei nº 8.036/1990, qual seja, seus primeiros artigos (especialmente do 3º ao 7º).

Portanto, fica desde já o alerta: estude com cuidado a Lei nº 8.036/1990, e com especial cuidado os mencionados artigos. É chato estudá-los, eu sei, mas deve-se a isso seu grande prestígio junto às bancas examinadoras.

Vejamos um pequeno esquema que pode auxiliar neste estudo.

1. CONSELHO CURADOR => estabelece normas e diretrizes sobre o FGTS

Composição:
- Representação dos TRABALHADORES;
- Representação dos EMPREGADORES; 
- Órgãos e entidades governamentais (MTE, MPOG, MF, MICT, CEF, BACEN)

Presidência: exercida pelo representante do MTE (se aparecer na sua prova Ministério do Trabalho e Previdência Social também está certo, pois esta é a literalidade da lei, embora desatualizada).

Membros titulares: são os Ministros de Estado (do Trabalho, do Planejamento, da Fazenda e da Indústria e do Comércio) e os Presidentes da CEF e do BACEN.

Membros suplentes: são indicados pelos membros titulares (cada um indica o seu) e nomeados pelo Presidente do Conselho Curador.

Representantes dos trabalhadores e dos empregadores: são indicados pelas respectivas centrais sindicais e confederações nacionais, e nomeados pelo Ministro do trabalho. O mandato é de 2 anos, permitida uma única recondução.

Reuniões: as ordinárias têm periodicidade bimestral, e são convocadas pelo Presidente do Conselho. Na omissão deste, qualquer membro poderá convocar a reunião, no prazo de 15 dias contados do bimestre desde a última reunião realizada. As reuniões extraordinárias podem ser convocadas por qualquer membro, desde que haja necessidade.

Quórum: exige-se maioria simples dos membros para a tomada de decisões pelo Conselho. O Presidente tem o voto de qualidade.

Despesas decorrentes da participação nas reuniões: cada entidade representada arca com as despesas dos seus representantes.

Natureza jurídica da ausência ao trabalho dos representantes dos trabalhadores: o tempo necessário para participação dos representantes dos trabalhadores no Conselho Curador constitui interrupção do contrato de trabalho, ou seja, lhe são asseguradas a remuneração e a contagem de tempo de serviço para todos os fins. A lei faz menção a “ausências abonadas”.

Provimento de meios necessários ao exercício da competência atribuída: cabe ao MTE, por meio da Secretaria Executiva do Conselho Curador do FGTS, proporcionar os meios necessários ao exercício da competência atribuída ao Conselho Curador.

Estabilidade no emprego: os representantes dos trabalhadores, tanto os efetivos quanto os suplentes, gozam de estabilidade (garantia provisória de emprego), desde a nomeação, até um ano após o término do mandato. A única possibilidade de dispensa é por motivo de falta grave, devidamente apurada em “processo sindical”.

Atribuições do Conselho Curador:

- estabelecimento de diretrizes e programas de alocação de recursos do FGTS, que podem ocorrer nas áreas de habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana, conforme estabelecido pelo Governo Federal;

- acompanhamento e avaliação da gestão econômica e financeira dos recursos;

- apreciação e aprovação dos programas anuais e plurianuais do FGTS;

- pronunciamento prévio sobre as contas do FGTS;

- adoção de providências em face da atuação do Ministério da Ação Social e da CEF, sempre que houver comprometimento indevido dos recursos do Fundo;

- interpretação das normas regulamentadoras do FGTS;

- aprovação do próprio regimento interno;

- fixação de normas e valores de remuneração do Agente Operador (CEF) e dos Agentes Financeiros;

- fixação de critérios para parcelamento dos recolhimentos em atraso;

- fixação de critérios e valor da remuneração para o exercício da fiscalização;

- fazer publicar, no Diário Oficial da União, as decisões proferidas pelo Conselho, as contas e os pareceres emitidos;

- fixação de critérios e condições para compensação entre créditos e débitos relativos ao Fundo;

- dispor, de forma abrangente, sobre o Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS).



2. MINISTÉRIO DA AÇÃO SOCIAL  => gestor da aplicação

Competência:

- gerir a aplicação do Fundo, conforme diretrizes e programas estabelecidos pelo Conselho Curador – CC;

- expedir atos normativos relativos à alocação de recursos para implementação de programas aprovados pelo CC;

- elaborar orçamentos anuais e plurianuais sobre aplicação dos recursos, por UF, os quais devem ser submetidos ao CC até 31 de julho;

- acompanhar a execução dos programas financiados por recursos do Fundo e implementados pela CEF;

- submeter ao CC as contas do FGTS;

- subsidiar o CC com estudos técnicos acerca dos programas aos quais se destinam os investimentos dos recursos do Fundo.  

- definir as metas a serem alcançadas nos referidos programas.


3. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF => agente operador

Atribuições da CEF:

- administrar as contas vinculadas e centralizar os recursos (o FGTS pode ser recolhido em qualquer banco, mas o numerário é repassado à Caixa, que opera os recursos);

- expedir atos normativos relativos à operacionalização do recolhimento do FGTS (ex.: convênios com bancos para formar a rede arrecadadora, utilização de software para transmissão de informações – Conectividade Social, etc);

- definir os procedimentos operacionais necessários à execução dos programas financiados por recursos do Fundo, estabelecidos pelo CC e cuja aplicação foi normatizada pelo Ministério da Ação Social. Sempre que, em relação ao FGTS, sejam mencionados “os programas”, trata-se dos programas de: a) habitação popular; b) saneamento básico; c) infraestrutura urbana;

- elaborar análises jurídicas e econômico-financeiras dos projetos que envolvem os programas a serem financiados com recursos do Fundo;

- emitir o Certificado de Regularidade do FGTS;

- elaborar as contas do FGTS, encaminhando-as ao Ministério da Ação Social;

- implementar os atos emanados do Ministério da Ação Social relativos à alocação dos recursos, de acordo com as diretrizes do CC;

- garantir aos recursos alocados no FI-FGTS a remuneração aplicável às contas vinculadas;

Abraço e bons estudos!

Ricardo Resende
ricardoresendeprof@gmail.com